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LOCALIZAÇÃO

BIOCENTRISMO: o equilíbrio ideal para uma comunidade caiçara em meio à Mata Atlântica

Imersão: Praia da Jureia

Onde: Iguape, Vale do Ribeira - SP

Ofício: Entalhe de madeira

Comunidade: caiçara

Partimos para o sul do estado de São Paulo,
em direção ao Vale do Ribeira 
e, mais uma vez, de forma não intencional
a desconfortável medida 
"Índice de Desenvolvimento Humano" nos seguia. 
A região tem o menor IDH do estado.

O Vale do Ribeira é intitulado como a “Amazônia paulista”, por ser a região com maior área de Mata Atlântica contínua no Brasil. Declarada como Patrimônio Natural da Humanidade, ela também é conhecida por abrigar um enorme complexo de cavernas, o que pode sinalizar os tantos descendentes de escravos e a formação de aproximadamente 90 comunidades quilombolas por lá, em diferentes estágios de validação.
Caverna esconde, protege, e um dia precisa soltar para a liberdade mundana. Mas a atmosfera de conflito e resistência continua viva sob o mesmo palco. E já detectamos que povo resistente é povo criador!
Mas nossa imersão em comunidades quilombolas no Vale do Ribeira veio mais tarde.

 

Agora, nosso foco era em comunidades caiçaras. Descemos em Iguape, município de maior área territorial do Vale e também de São Paulo. Em tupi, Iguape significa “na enseada do rio”.

O Rio Ribeira de Iguape, majestoso, abriu nossa passagem em direção ao ponto 1 da nossa imersão pelo Vale: a Praia de Jureia, região preservada onde hoje se encontra a Estação Ecológica Jureia-Itatins.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fomos recebidos no Centro de Cultura Caiçara, ponto físico de discussão política e cultural. O espaço luta, ativamente e com embasamento, por três objetivos principais: preservação da cultura tradicional, desenvolvimento sustentável local e reivindicação dos direitos territoriais.

E por que essa luta?
 

  • 1958: instituiu-se uma Reserva Estadual, que sugeria a preservação da Mata Atlântica na região, mas que nem sempre os interesses por trás eram voltados ao meio ambiente.
    Resistência!

     

  • Ditadura militar, anos 80: tentaram construir uma usina hidrelétrica na região. A coexistência de uma Reserva Ecológica e uma Usina Nuclear deu a confirmação de que “véus ambientais” estavam sendo colocados em prol de interesses econômicos.
    Resistência!

     

  • Fim da ditadura, 1988: implementa-se a Estação Ecológica Jureia-Itatins. 500 famílias tradicionalmente residentes daquela área há pelo menos 150 anos são expulsas de suas terras e obrigadas a migrar para as periferias de Peruíbe e Iguape, sem receber nenhuma indenização do governo, com diversas restrições impostas.
    Resistência, até hoje!

     

Responsabilidade ambiental, sem nenhum direito humano?

Longe do seu chão, algumas das famílias que migraram forçadamente se organizaram e, nos anos 90, criaram a Associação dos Jovens da Jureia, formalizando o seu esforço. Mais tarde, com o convênio do Ministério da Cultura – Minc, a AJJ conseguiu criar o Centro de Cultura Caiçara, onde passamos o maior tempo da imersão em companhia das artesãs Dalva, Glória, e seus familiares.

Os caiçaras representam um forte elo entre
o homem e seus recursos naturais,
gerando um raro exemplo de comunidade
harmônica com o seu meio ambiente. 

Da mistura terra e mar, esse povo brasileiro
é originalmente uma herança da união
de indígenas litorâneos com colonos navegantes,
que se fincaram nos costões rochosos, mangues e encostas da Mata Atlântica.

HISTÓRIAS GUARDADAS SOB AS ÁGUAS

"O nome 'Jureia' é uma homenagem à filha de piratas que desembarcaram nessas terras pela primeira vez. Ela chamava Jureia, e morreu no navio durante a travessia. Seus pais, de tristeza, enterraram seu corpo junto de todo ouro que possuíam.
Dizem que anos depois encontraram os restos mortais da moça junto com o ouro, e com essa riqueza os primeiros habitantes daqui começaram a construir a nossa comunidade".


Dona Glória quem nos contou.
A tradição oral é uma cultura viva nas comunidades caiçaras. As lendas envolvem e conectam o ouvinte ao passado, onde suas origens se misturam com o imaginário popular.

Para financiar esse desafio, que 30 anos mais tarde ainda não foi vencido, a AJJ conta com a renda proveniente da comercialização do artesanato local. Na marcenaria é desenvolvido um trabalho de excelência em entalhe na madeira da caixeta, espécie arbórea nativa e dominante da região.

 

Mas a produção artesanal também está sob ameaça. Antes da implementação da Reserva Ecológica, a própria comunidade exercia o manejo sustentável da caixeta, para subsistência, em pequena quantidade, objetivando circular a economia local. Hoje, os artesãos se veem reféns do comércio autorizado da madeira, feito por quem possui as burocráticas licenças para o manejo. A compra se tornou inviável, pois o custo da madeira e frete com relação ao pouco volume utilizado é muito alto para que as atividades se viabilizem. Com base em estudos florestais, a comunidade sugere a implantação de um reflorestamento da espécie, 

Se ativa movimento político. "A Jureia se tornou uma região de conflito social e jurídico, causado por políticas de conservação da natureza com base cientifica discutível, que desconsideram os direitos de povos e comunidades tradicionais (...) que habitaram secularmente esses territórios sem prejuízo de sua integridade, e por um aparato institucional autoritário que priva os moradores de direitos básicos de cidadania"

 

Na ética ambiental a relação homem-natureza devia levar em conta as duas existências, para que sua interação fosse sustentável e inteligente.
Sabemos que a ideia de antropocentrismo é doente. O homem não deve ser dominador à natureza. Habitamos um espaço anterior a nós, que tem o poder de se regenerar, mas que não é infinito. Devagar, tentamos excluir qualquer resquício dessa ideologia cheia de ego e valor monetário.

Por outro lado, o ecocentrismo também tem ressalvas. A natureza como fim de si mesma exclui a existência humana e a possibilidade de evolução e continuação da nossa espécie.

O que a comunidade luta é por uma abordagem mais crítica e coerente dos órgãos públicos e suas legislações, independente de interesses econômicos, estéticos ou científicos. Não se trata de um grupo exploratório! Agressões ao meio ambiente estão ligadas ao fator escala. Se trata de uma comunidade que sempre preservou seu território, e afinal, possibilitou que hoje ele seja justamente essa Mata Atlântica conservada.

Mas, por ser minoria, foi expulsa sem diálogo público. 

O BIOCENTRISMO
aborda tanto a natureza quanto o homem como destinatários. 

Se hoje o ser humano é integrante à natureza, para viver em equilíbrio, deve ter espaço e função própria dentro dela. ​

O sonho de retornar para a terra onde os avôs moravam continua movendo esses jovens,
O orgulho em dançar fandango, tocar viola e rebeca, entalhar a caixeta, e continuar promovendo reflexão e diálogo entre a comunidade, justifica com beleza e verdade a luta embasada para que os direitos de suas famílias sejam garantidos na constituição.

Que consigamos sempre considerar e preservar o nosso papel em meio à natureza!

O MAOS cocriou uma nova linha conservando a linguagem tradicional do artesanato da Jureia.
São jóias e acessórios com a caixeta entalhada à mão pelas artesãs.
Quando coloridas, o pigmento é à base de água, minimizando o impacto ambiental.
Concha, costela de adão, helicônia e o pintassilgo são os símbolos que trabalhamos e que reconectam a artista ao seu território.

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